quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Ampla defesa no processo administrativo - súmula do STJ

O STJ, recentemente, sumulou o seguinte:
Súmula 343:
é obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar”.
Particularmente, não concordo com a súmula.
Primeiro, porque viola a Lei do Processo Administrativo (Lei 9.784/98), que diz o seguinte:
"Art. 3o O administrado tem os seguintes direitos perante a Administração, sem prejuízo de outros que lhe sejam assegurados: (...)
IV - fazer-se assistir, facultativamente, por advogado, salvo quando obrigatória a representação, por força de lei".
Segundo, porque deu uma dimensão ao direito à ampla defesa maior do que a Constituição lhe confere. É um formalismo muito grande exigir que o servidor esteja sempre acompanhado de um advogado, mesmo nos processos disciplinares mais banais e mesmo quando ele próprio prefira fazer a sua defesa.
Considero que o direito à defesa técnica é uma faculdade e não uma obrigação. Se o servidor quiser, a Administração não pode lhe negar o direito de estar assistido por um advogado. Ou seja, na minha opinião, é obrigatória não a presença em si do advogado, mas sim a chance de o servidor ser assistido por um, se esse for seu interesse. Se ele não quiser um advogado, ele próprio pode fazer sua defesa.
E outra: afinal, quem vai pagar esse advogado? O servidor ou a Administração?
Se o servidor tiver condições de contratar um advogado, parece óbvio que será ele quem tem que arcar com os custos de sua defesa. Mas se ele não quiser um advogado? Mesmo assim vai ser obrigado a contratar?
Por isso, penso que a súmula merece ser revista. Ou pelo menos melhorada. Por exemplo, poderia ser assim: "é obrigatória a presença do advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar que possa resultar em demissão do servidor".

3 comentários:

Unknown disse...

e o pior é que me parece que a súmula contraria a norma do art. 30, que prevê a presença facultativa. Mas não é possivel alegar inconstitucionalidade de súmula...

Anônimo disse...

Penso que o enunciado não retrata o perfeito teor dos julgados que lhe deram origem. A redação dá a entender a obrigatoriedade da presença do advogado, sem mencionar a figura do "defensor" designado pela Administração.

Ao que parece,como já vinha sinalizando, o STJ firmou o entendimento de que a facultatividade prevista nos diplomais legais (Lei 9.784/98 e 8.112/90), em regra, não atende ao preceito constitucional de garantia ao contraditório e ampla defesa, afetando a higidez do devido processo legal, notadamente no aspecto substancial.

Apesar de não concordar, a posição do STJ é sedutora, notadamente pela invariável condição de hipossuficiência do acusado frente à máquina administrativa. Não há como olvidar essa questão.

No entanto, os julgado que originaram o enunciado não ignoram a figura do defensor (dativo) designado pela Administração. Sempre há referência a essa figura.

Pois bem, como conciliá-lo a essa nova realidade processual-disciplinar. Penso, assim como vinha decidindo o STJ, que no início do processo disciplinar há necessidade de "notificar" o acusado para nomear defensor (advogado), sob pena de ser-lhe designado defensor dativo para todos os atos da instrução processual.

Há, na realidade, uma espécie de "adiantamento" da designação por parte da Administração do defensor dativo, já que essa figura está prevista da Lei 8.12/90 apenas para os casos de revelia, uma vez "citado" o acusado para apresentar defesa e não o fazendo.

Com isso, busca-se a real garantia, ao menos uma tentativa, de efetiva defesa técnica no curso da instrução processual. Elimina-se, assim, a figura do tal defensor ad hoc, servidor designado minutos antes de uma audiência para apenas se fazer presente para dar "conformidade" a audiência. Uma aberração comum nos processos disciplinares.

Veja que o próprio acusado não precisa estar presente na audiência de testemunhas. Como então fazer se este não nomeia advogado e não se apresenta para acompanhar o processo. A súmula em princípio inviabilizaria inúmeros, na realidade milhares, de processos disciplinares em que há acusado. Por isso, a meu ver, não há como entendê-la dessa forma.

Em outro aspecto, parece que a facultatividade prevista na lei não atende, de fato, ao preceito constitucional. Em muitos casos tem o condão de dar falsa impressão ao acusado que o processo disciplinar pode transcorrer sem maiores dificuldades. As comissões trabalham, fazem toda instrução sem qualquer intervenção efetiva do acusado. Quando a coisa fica um pouco complicado, normalmente no momento da indiciação e citação para apresentar defesa escrita, é que a ficha caí. Aí pode (ou não) ser tarde demais.

Penso, com isso, ao contrário do que defendem alguns,que de modo algum há que se falar nesses casos de "venire contra factum proprium", pois, em regra, a manifestação de vontade do servidor esteve todo o tempo viciada.

Para garantir que isso não ocorra é que é que "é obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo", ou seja, e enunciado, a meu ver, traduz a idéia de que não há mais facultatividade para o acusado. Em outras palavras, o servidor não pode mais escolher entre acompanhar o processo por si ou com a figura do advogado. A figura do advogado, quando confrontada com a possibilidade de escolha do acusado, passou a ser obrigatória. Esse é o contexto,

Penso, assim, que a súmula extermina a facultatividade. O acusado não pode mais, a despeito de uma defesa técnica efetiva, acompanhar por si a instrução do processo. Isso, de modo algum, significa que o mesmo está obrigado a nomear advogado. Pelo contrário, o que o acusado "perdeu" (em termos) foi o "direito" (melhor seria dizer que perdeu a possibilidade) de estar no processo desacompanhado. É nesses termos que a presença do advogado passou a ser obrigatória.

Assim, nessa mesma idéia de defesa técnica efetiva, percebendo a comissão processante que o servidor acusado não nomeará defensor, deverá oficiar a autoridade instauradora para que este designe o defensor dativo para acompanhar toda a instrução do processo, pois o acusado não poderá fazê-lo sem a presença de alguém que efetivamente tenha condições de garantir-lhe o contraditório no curso da instrução.

Ganha, nessa visão, importante papel a designação do defensor dativo, que deverá recair preferencialmente sob servidor detentor de conhecimentos jurídicos que possam garantir efetividade a defesa do acusado. Esse servidor deverá acompanhar toda instrução, salvo se o acusado no curso do processo nomear advogado.

Eis o meu entendimento acerca do truncudo teor da súmula em comento.

Alexandre Lopes
ex-Corregedor Regional PRF/ES

Anônimo disse...

Penso que o STJ deveria ater-se ao seu papel institucional de defesa da lei nacional. Vai de encontro à Lei do Proc. Administrativo referida súmula. Seria elogiável o verbete se garantisse ao interessado, num determinado processo administrativo, a ciência do direito de defesa técnica e não obrigá-lo a isso. Tudo bem que não cabe ADI contra Súmula como já postado acima; mas nada impede que o assunto chegue ao STF e lá - quem sabe - a regra tome seu verdadeiro sentido.
Célio Silva
prof. Dir. Constit/ Penal