quarta-feira, 7 de maio de 2008

Mudança à vista: do blogspot para o worpress

9 entre 10 blogueiros consideram que o worpress é bem melhor do que o blogspot.

Sempre gostei do blogspot. É fácil de usar e tem um layout que me agrada. Mesmo assim, fui conhecer o wordpress.

Embora tenha sentido um pouco de dificuldade no começo, percebi que, de fato, o worpress possui muito mais ferramentas do que o blogspot. É outro nível. E também é fácil de usar, sobretudo quando se acostuma.

Por isso, resolvi migrar para o novo sistema.

O novo endereço do blog, ainda em fase experimental, é: http://direitosfundamentais.wordpress.com ou então http://direitosfundamentais.net


Para inaugurar o novo sistema, fiz mais um post da série "Filosofia Barata do Direito".

Espero que agrade.

George Marmelstein

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Os Aristocratas e os Direitos Fundamentais: devem existir limites jurídicos para o humor politicamente incorreto? – Por George Marmelstein

O objetivo deste post é tão somente fazer alguns comentários acerca da discussão levantada pelo Dr. Adriano Costa, conceituado professor universitário, que, num dos pontos altos de sua carreira jurídica, defendeu a livre divulgação de uma piada chamada “Os Aristocratas”, contada no submundo da comédia norte-americana.

Para analisar o caso com todas as informações disponíveis, fiz uma pesquisa com os termos “aristocrats jokes” no site “Youtube” para saber do que se trata.

De cara, foi possível perceber duas coisas. Em primeiro lugar, a piada é mesmo pesada. Há sexo grupal, incesto e tudo o que a mente doentia do humorista puder criar. Em segundo lugar, é inegável que os comediantes levam isso numa boa. Uma pessoa minimamente inteligente percebe com facilidade que se trata de uma grande brincadeira, ainda que de extremo mau-gosto.

É um humor no mesmo estilo do “Borat”, aquele filme/documentário retratando uma viagem simplesmente hilária que o “segundo melhor repórter do Cazaquistão” fez aos Estados Unidos. Para muitos, o filme é ofensivo, pois menospreza judeus, deficientes, mulheres, religiosos conservadores e muito mais. Para outros tantos, tudo não passa de uma crítica bem-humorada aos valores e à hipocrisia norte-americana.

Até que ponto a liberdade de expressão protege esse tipo de humor? Quais são os limites da brincadeira? O que o Estado pode (se é que pode) fazer para reprimir tais condutas? Melhor dizendo: o Estado deve reprimir o humor politicamente incorreto?

Não são questões simples de responder, nem pretendo fazê-lo. Quero apenas apresentar alguns dados que podem ajudar a resolver esses dilemas.

Nos EUA, o desenvolvimento da liberdade de expressão foi influenciado com intensidade pelos argumentos de Stuart Mill, que era um ardoroso defensor do “livre mercado de idéias”. Mill defendia uma espécie de “laissez-faire” intelectual, de modo que o Estado, em regra, não deveria intervir no exercício da manifestação do pensamento. Lá, eles levam muito a sério esse princípio, tanto que adotam posturas que, para o resto do mundo, soam absurdas. Por exemplo, os norte-americanos acreditam que os defensores de idéias nazistas ou racistas estão protegidos pela Constituição, de modo que ninguém pode ser punido por defender, no plano das idéias, o holocausto judeu ou a supremacia branca.

No que se refere ao humor, um caso paradigmático que demonstra a abrangência que eles dão à liberdade de expressão foi retratado no filme “O Povo contra Larry Flynt”.

Os fatos que deram origem ao processo judicial, que chegou até a Suprema Corte, foram bem interessantes.

Larry Flynt, o dono da revista pornográfica “Hustler Magazine”, publicou a seguinte matéria:



Em síntese, o quadrinho narra como teria sido a primeira vez em que o reverendo Jerry Falwell, um dos líderes religiosos mais conservadores dos EUA, teria feito sexo. Para resumir, o texto insinua, em tom de brincadeira, que Falwell teria perdido a virgindade com a mãe dele!


Em letrinhas miúdas, na parte de baixo do anúncio, houve a preocupação de incluir os seguintes dizeres: "ad parody - not to be taken seriously". Ou seja: não leve a sério o anúncio.

É óbvio que o reverendo Falwell não ficou contente com aquilo. Por isso, ingressou com ação indenizatória, alegando que a matéria difamatória teria lhe causado danos emocionais e morais. Ganhou nas instâncias inferiores. O caso chegou até a Suprema Corte.

Infelizmente, terei que contar o final do filme para continuar o raciocínio.

A Suprema Corte norte-americana, em suma, entendeu que a brincadeira estaria protegida pela liberdade de expressão. Em resumo, argumentou-se (a) que "a livre circulação de idéias encontra-se no coração da primeira emenda"; (b) que as figuras públicas estão sujeitas a uma crítica mais intensa da mídia e do público de um modo geral; (c) que as sátiras estão protegidas pela liberdade de manifestação de pensamento; (d) que mesmo os discursos ofensivos e desagradáveis estão, em princípio, protegidos pela liberdade de expressão, ainda que a sociedade não simpatize com as idéias.
Para ver os argumentos na íntegra (em inglês), basta clicar aqui.


Não sei se aqui no Brasil o processo teria o mesmo desfecho, até porque, além da ofensa à honra do líder religioso, a matéria foi publicada com claro objetivo comercial, ilustrando uma propaganda do “Campari”. Ou seja, o nome, a imagem e a reputação de Jerry Falwell foram indevidamente utilizados para vender mais bebidas.

Tirando isso, se fosse um quadro humorístico “impessoal”, ou seja, que não atingisse nenhuma pessoa em particular, não vejo motivo para excluí-lo da proteção constitucional, especialmente porque foi publicado em revista dirigida ao público adulto.

O que quero dizer é que a mera narração de uma atividade sexual, sobretudo em tom humorístico e voltada a um público adulto, estaria, em princípio, protegida pela garantia constitucional de livre manifestação do pensamento, não podendo ser objeto de censura. Creio que até mesmo os juristas mais conservadores concordariam com essa conclusão.

O problema da piada “Os Aristocratas” é este: por mais que seja apenas uma piada, será que todos estão dispostos a ouvir esse tipo de brincadeira? Será que o ambiente em que a piada é contada não deve ser levado em conta?

Acredito que o ambiente em que a piada está sendo contada é um fator de suma importância para solução do caso. Contar a piada numa igreja ou numa escola infantil certamente é uma afronta ao público que não pode ser tolerada. Do mesmo modo, e aqui estou apenas especulando, talvez contar no “Programa do Jô” viole o artigo 221 da CF/88, quando diz que a programação das emissoras de televisão deverá respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família. Embora o público do “Jô” seja basicamente adulto, certamente nem todo mundo espera ouvir uma piada de tamanho mau gosto.

Por outro lado, num Teatro com o público já sabendo de antemão que o comediante conta piadas de humor negro, talvez a balança vá para o lado da liberdade de expressão.

Foi mais ou menos o que decidiu o STF no já mencionado caso Gerald Thomas. Quando mostrou as nádegas e simulou uma masturbação como reação às vaias do público que o assistia, Gerald Thomas estava em um Teatro, no Rio de Janeiro, às duas horas da madrugada, após o término de uma peça que continha cenas de nudez. Por isso, foi inocentado da prática de ato obsceno, pelo STF, que entendeu que o ato estaria protegido pela liberdade artística. Certamente, se o mesmo ato fosse praticado às nove horas da manhã, numa peça de teatro infantil, a solução seria diferente.

Além disso, há ainda a questão da discriminação. Não sei se é possível estabelecer uma imunidade completa para os humoristas ofenderem suas "vítimas" à vontade. Devem existir limites, embora, confesso, não acho que seja possível defini-los abstratamente.

Lembro, por exemplo, do caso "João Kléber", que sofreu problemas com a Justiça por fazer piadas de mau-gosto contra os homossexuais. O apresentador costumava fazer pegadinhas que discriminavam os gays. Por isso, teve que tirar seu programa do ar.

Do mesmo modo, o Ratinho sofreu ação judicial em razão de explorar a miséria humana em seus programas, especialmente as deficiências físicas. O STJ julgou contra o apresentador.

Perceba que, nesses casos de programas televisivos, a potencialidade da ofensa é muito maior do que numa publicação restrita, pois o público é atingido pela informação de forma quase involuntária. Por isso, há uma necessidade maior de restringir a liberdade de expressão em favor da construção de uma sociedade sem preconceitos. Isso, contudo, não significa que devemos criar uma "ditadura dos direitos fundamentais". O discurso politicamente correto em excesso pode se tornar uma forma de tirania tão maléfica quanto à própria discriminação.

Em síntese, como qualquer questão envolvendo colisão de valores constitucionais, a discussão é tópica e complexa. A solução vai depender bastante das informações do caso concreto. E o magistrado deve ter a sensibilidade para fazer uma correta ponderação dos valores em jogo, de modo a prestigiar a harmonização dos princípios em colisão, dentro dos critérios da proporcionalidade. (Adoro essa resposta. Serve pra tudo!).

Marcha da Maconha: um "tapinha" na democracia

Assistindo ao Fantástico ontem à noite, fiquei impressionado com a falta de maturidade democrática de nosso país, especialmente porque, no caso, houve o aval do Judiciário.


Foram concedidas diversas ordem judiciais pelo Brasil afora proibindo a realização da "Marcha da Maconha", evento que pretendia reunir pessoas favoráveis à legalização da droga no país.


Confesso que não tenho opinião formada quanto ao mérito da questão em si (liberação da maconha), mas a tese não é tão absurda ao ponto de se proibir até mesmo a sua discussão. Talvez existam alguns crimes que sejam tão abomináveis que a mera defesa de sua descriminalização soe como uma heresia. Pedofilia e racismo se incluem nessa linha. Mas a legalização da droga? Desde que me entendo por gente esse assunto é discutido abertamente sem censura, até mesmo em respeitáveis congressos jurídicos. Por que proibir uma marcha em defesa da tese?

O Dimitri Dimoulis e o Leonardo Martins, no seu "Teoria dos Direitos Fundamentais" (ed. Revista dos Tribunais), apresentam um estudo de caso bem interessante envolvendo uma questão muito parecida. Eles chamaram o hipotético caso de "A Polêmica da Camiseta". Em síntese, um estudante universitário foi punido disciplinarmente pela faculdade em que estudava por usar uma camiseta com os seguintes dizeres: "meu patrão, que bebe uísque, é considerado um cidadão exemplar. Eu, que fumo maconha, sou chamado de marginal? Legalize já!"

Eles apresentaram excelentes argumentos em favor do aluno, concluindo que sua atitude estaria protegida pelo direito fundamental à liberdade de expressão, já que o que o aluno fez foi uma defesa, no plano das idéias, da mudança da lei penal e não um defesa do seu desrespeito, o que configuraria apologia ao crime.


Pelo que vi no site do movimento "Marcha da Maconha", também não há qualquer estímulo ao desrespeito à lei penal, tanto que há a seguinte advertência em destaque: "é proibido o uso da maconha na marcha".


Estou ansioso para ver o fundamento das decisões judiciais, pois confesso que não consigo encontrar qualquer suporte jurídico minimamente consistente capaz de justificar uma medida tão anti-democrática.


Onde está o direito de reunião? Onde está a liberdade de expressão? Defender a legalização da maconha é ato ilícito?

Enquanto houver esse tipo de patrulhamento ideológico, não se pode dizer que se vive numa democracia.

De qualquer modo, os organizadores do evento certamente atingiram seu objetivo que foi chamar a atenção da sociedade. Nas capitais em que a marcha foi autorizada, praticamente não houve repercussão. Se havia cem manifestantes era muito e tudo transcorreu tranqüilamente. Já nas cidades em que houve proibição, houve confronto com a polícia e a mídia divulgou tudo abertamente. No final, as ordens judiciais foram até boas (do ponto de vista publicitário) para os participantes da marcha. Tenho certeza de que a próxima contará com algumas dezenas de milhares de participantes... Tudo graças à proibição!

Para finalizar, dentro do espírito do post, disponibilizo um video clipe de uma música do Bob Marley interpretada pelo Ministro Gilberto Gil: